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Mostrando postagens de dezembro, 2017

No peito dos desafinados também bate um coração...

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O filme vale pela precisa atuação de Meryl Streep, equilibrando com perfeição humor e drama. Por causa dela, nos afeiçoamos à Florence e, se rimos nos momentos que ela tenta cantar, também nos deixamos contagiar por seu genuíno amor pela música. Os dramas reais pela qual a verdadeira Florence Foster Jenkins (1868—1944), passou, são habilmente explorados pelo roteiro, o que faz com criemos ainda mais empatia para com a personagem. Talvez o pior deles seja ter contraído sífilis, na noite de núpcias, com seu marido, o Dr. Frank Thornton Jenkins. Quando se casaram, em 1885, ele tinha 33 anos. Ela tinha apenas 17 anos. Quando criança Florence iniciou carreira na música como pianista, apresentando-se como “Little Miss Foster”.Chegou inclusive a dar um recital na Casa Branca durante o governo do Presidente Rutherford B. Hayes. Em consequência de sua doença, que ataca o sistema nervoso, tocar piano ficou cada vez mais difícil. Como o tratamento disponível à época incluía a ingestão de merc

No fundo, no fundo...

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Scorsese, que quando criança queria ser padre, faz aqui mais um belíssimo e provocante auto-de-fé, muito semelhante, nas questões que provoca - e que vão além do tema da verdade da fé e de suas manifestações - ao A Última Tentação de Cristo (The Last Temptation of Christ, 1988), que ele mesmo dirigiu, cerca de 30 anos atrás. Em essência, ambos tratam da compreensão que se tem da fé que se tem, das escolhas, concessões e sacrifícios feitos em nome dela e do modo como ela é professada e vivida por cada pessoa. A questão mais pertinente aqui gira em torno da apostasia, que é a negação da fé, tal o apóstolo Pedro que negou Cristo por três vezes antes do galo cantar. Até que ponto sofrer e morrer pela fé para não negá-la é necessário se, ao morrer na cruz Cristo teria pago por todos os nosso pecados? Não seria melhor negar a fé e pecar, sofrendo a culpa como um martírio, mas certo do perdão que o sacrifício do Cristo legou? Aceitar o pecado, a condição de pecador, é prova de fé, sus

Amar, verbo intransitivo

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O filme não é uma ficção científica ao estilo Christopher Nolan (como Interestellar) na qual que tudo segue uma lógica científica e possui uma explicação. É uma espécie de parábola, um conto moral, mas em forma de ficção científica. Tudo tem um sentido metafórico, e a crítica, cheia de ironia e sarcasmo, do filme é direcionada à muitos aspectos de nossa vida. Eu destacaria 5 pontos: 1) nossa dificuldade em nos relacionar com as diferenças, nossa necessidade de nos encaixar em padrões para sermos aceitos ou de buscar pessoas que se encaixem em padrões que nós preestabelecemos; 2) essa necessidade de nos encaixar em padrões nos divide, de acordo com os padrões criados, como, por exemplo, ser solteiro, se casado, 3) os que optam por ser solteiros e os que optam por casados tendem a defender seu modo de vida, apregoa-lo como o ideal, enxergam o outro como um fracassado, alguém que não "deu certo na vida"; 4) a pressão social (Durkheim chamou de Fato Social) por nos casarmos q

Maior abandonado

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Baseado numa história real, com o roteiro inspirado no livro de John Krakauer - o mesmo autor do livro que inspirou o filme Everest (2015), também baseado em uma história real - este filme marcante é dirigido com notável maestria pelo também ator Sean Penn, ganhador de 2 Oscar. O elenco é formidável (destaque para Hal Holbrook, como o solitário Ron Franz), a fotografia é espetacular, a edição é ágil, sem ser frenética, e a trilha sonora é uma das que eu mais amo. O modo como o diretor Sean Penn explora as idiossincrasias do protagonista, suas feridas, dúvidas, anseios, mágoas, é exemplar, pois consegue nos dar a medida de sua obliteração interna. Christopher "Supertramp" McCandless era um jovem idealista, que cresceu em um lar disfuncional - uma típica familia de classe média norte-americana, com sua fachada aparentemente perfeita contrastando com o interior em decomposição. A inadequação do personagem frente uma realidade social baseada em aparências, em individualismo e

PigmaLou ou My Fair Sally?

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Parece um filme sobre o crime organizado e a máfia. Parece um filme sob cassinos. Parece um filme sobre tráfico de drogas. Na verdade estes são apenas pano de fundo para uma outra narrativa. O que o cineasta Louis Malle faz neste notável filme é contar uma história torta e na ortodoxa sobre redenção, sobre o drama da finitude, sobre pessoas se apegam ao que (a chance de um futuro promissor, ou volta a um glorioso passado) consideram ser a última chance de confrontar e vencer o fracasso, e sobre a relação dialética entre o velho e o novo, entre o passado e o presente. Sally (Susan Sarandon) é a moça ambiciosa do interior que se casou com um jovem irresponsável e imaturo para tentar vida nova na cidade grande. Para sua infelicidade, a cidade para qual se dirige é a - outrora agitada e badalada - agora decadente Atlantic City. Abandonada pelo marido, que a trocou pela irmã mais nova, ela trabalha no buffet do restaurante de uns cassinos que são cada vez mais numerosos na cidade, e tenta