Um Legado

Nenhum esporte foi tão retratado nos cinemas quanto o pugilismo - ou boxe, como é mais conhecido. A origem desse esporte é controversa: alguns afirmam que surgiu na Inglaterra, outros na Irlanda, mas o esporte seria conhecido desde a antiguidade. Onomasto de Ermínia, por exemplo, pugilista vencedor nos jogos Olímpicos do ano 688 a.C., é tido como o primeiro a definir as regras do esporte.

No cinema, ele aparece desde os primeiros clássicos do cinema mudo, como em Luzes da Cidade (1925), de Chaplin. Depois em filmes consagrados como O Delator (The Informer, 1935), de John Ford, com Victor McLagen; Corpo e Alma (Body and Soul, 1947), de Robert Rossen, com John Garfield; e  Marcado pela Sargeta (Somebody Up There Likes Me, 1956), de Robert Wise, com Paul Newman.


No entanto, o filme que marcou, entre o público, o esporte na sétima arte, foi Rocky, um lutador (Rocky, 1976), de John G. Avildsen. Marcou porque lançou ao estrelato o jovem Silvester Stallone - que havia começado a carreira no filme pornô e de repente se via indcado ao Oscar de Melhor Ator e Melhor Roteiro -, pela trilha sonora que se tornaria lendária e pelas cenas que entrariam para o imaginário coletivo: o boxeador treinando no frigorífico, depois correndo pelas ruas e sendo seguido por uma multidão que o admira e incentiva, e finalmente subindo as escadarias e erguendo os braços para a glória.


O filme foi um sucesso tremendo, ganhou 3 Oscar e 5 sequências, alguns inclusive dirigidas por Stallone: Rocky 2 (1979), Rocky 3 (1982), Rocky 4 (1985), Rocky 5 (1990), Rocky Balboa (2006). O último filme - por enquanto - a dar sequencia à história é Creed, Nascido para Lutar (Creed, 2915), dirigido por Ryan Coogler e protagonizado por Michael B. Jordan, acompanhando - claro - do onipresente Stallone, revivendo pela 7ª vez Rocky Balboa.

Creed, por sua vez, segue à risca não apenas os mais conhecido clichés dos filmes de boxe, como também tenta emular a estrutura do primeiro filme da saga e estabelecer um estreito diálogo com ele. Quem assistir o filme verá todos os clichés na tela: 1) o jovem herói desacreditado que precisa provar seu valor; 2) o treinador já idoso que inicialmentee se recusa a treina-lo mas depois acaba cedendo; 3) o adversário durão, temido e com ares vilanescos, que ele enfrentará no final; 4) a saúde percária do velho treinador e mentor que se converte num desafio dramático e afetivo ao personagem; 5) a briga ou confusão na qual ele se envolverá na vésperas da luta final e poderá colocar tudo a perder.

As semalhanças com o filme original/primordial também são óbvias: o treinamento "old school" que o protagonista receberá de seu mentor; a cena em que ele, correndo, será seguido pacificamente por um grupo populares, culminando num cena apoteótica; uma releitura das velhas brincadeiras do "toc, toc"; a luta final da qual ele não sairá vendedor (no filme original a vitória no combate pertence a Apollo Creed, no Brasil a dublagem dá um empate para os lutadores); o calção listrado de branco de vermelho; a subida da famosa escadaria.

Creed, assim como Rocky, não é uma obra-prima de perfeição técnica, artística e dramática, como foi Touro Indomável (Raging Bull, 1980), de Martin Scorsese, com Robert DeNiro. Nem temm om mérito de subverter a estrutura do gênero de filme em que se enquadra, como foi o caso de Menina de Ouro (Million Dollar Baby, 2004), de Clint Eastwood, com Hillary Swank, em que o diretor mergulhava desconhecido universo do boxe feminino e estabelecia um brilhante diálogo com outro gênero cinematográfico: o western.

Creed é, nesses aspectos, convencional, à semalhança do recente Nocaute (Southpaw, 2015). Contudo, ele se destaca num ponto muito importante, que está ligado aos recentes debates sob racismo e representatividade: ter um negro como protagonista. Apesar do boxe ter tido entre os negros alguns de seus mais lendários pugilistas (Sugar Ray Robinson, Muhammad Ali, Rubin "Hurricane" Carter, Mike Tyson...), em todos os filmes acima citados, os protagonistas eram brancos. Sendo assim, o protagonismo de Jordan nesse filme acaba se constituindo numa espécie de pioneirismo. E essa iniciativa, por parte do diretor e roteirista Ryan Coogler - também ele um negro - é sem dúvida louvável.

É praticamente certo que Stallone levará a estatueta de Melhor Ator Coadjuvante revivendo um personagem icônico do cinema que ele mesmo criou quando, em meados da década de 1970, escreveu em apenas três dias o roteiro de Rocky. Segundo ele, após assistir uma luta na qual até então o desconhecido Chuck Wepner, resistiu por 15 rounds em uma luta com o campeão Muhammad Ali, chegando inclusive tomba-lo certo momento da luta. É a consagração merecida por mais 30 anos dando corpo e alma pelo mais famoso lutador de boxe do cinema.

CREED - NASCIDO PARA LUTAR (Creed, 2015)
Direção: Ryan Coogler
Elenco: Michael B. Jordan, Silvester Stallone, Tessa Thompsom
Vencedor do Globo de Ouro de Melhor Ator Coadjuvante
Indicado ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante
Minha nota: ★★★★★★☆☆☆☆

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